03/01/2024
Autoconhecimento
Psicanálise – 10 Conceitos Fundamentais
A psicoterapia é uma das invenções mais valiosas das últimas centenas de anos, com um poder excepcional de aumentar nossos níveis de bem-estar emocional, melhorar nossas relações, recuperar o clima em nossa família e nos ajudar a explorar nosso potencial profissional. No entanto, também é profundamente mal-entendida e alvo de muitas fantasias, esperanças e suspeitas nada úteis. Sua lógica raramente é explicada e sua voz, pouquíssimo ouvida com a objetividade suficiente.
Regra Fundamental
Quando estava tentando descrever o processo de terapia, Sigmund Freud afirmou que ela realmente exigia uma única coisa dos pacientes: que eles “dissessem tudo o que vinha a cabeça, mesmo que fosse desagradável”. Freud chamava isto de “regra fundamental” da terapia – e o único caminho para o tratamento bem-sucedido.
Aqui estão 10 pequenos textos sobre seus principais conceitos:
1. Sintomas e Causas
As pessoas costumam ir para a terapia quando estão sobrecarregadas por sintomas dolorosos com causas que elas não conseguem entender. Por que estão sempre tão tristes? Por que têm tanto medo de serem demitidas – sem ter feito nada de objetivamente errado? Por que o sexo não é mais possível?
A meta da terapia é ir abaixo do “problema apresentado” na superfície para localizar (e tratar) o que realmente está em jogo. Sigmund Freud, inventor da psicanálise e da psicoterapia, merece seu lugar na história do século 20 graças a seu entendimento tremendamente sutil sobre a forma cruéis em que sintomas se desconectam de suas verdadeiras causas. Não conseguimos lembrar ou imaginar facilmente o que nos aflige e, assim, não conseguimos nos recuperar. Na superfície, podemos ser perturbados por uma necessidade de limpar freneticamente a casa, mas, ao longo de muitas sessões de terapia, acabar percebendo que estamos ansiando inconscientemente por eliminar uma sensação de sermos rejeitados e considerados “ruins” na primeira infância por um pai desdenhoso.
2. Trauma de Infância
Na Grécia antiga, a palavra “trauma” significava uma ferida física. A psicanálise é construída em torno da ideia de que cada infância envolve um grau inevitável de ferimento emocional. Nada particularmente sinistro precisa acontecer para que todos fiquem traumatizados de formam que prejudicam nossas chances de encontrar satisfação na vida adulta. Em seu Esboço de Psicanálise, Freud define o trauma de infância como “uma incapacidade de lidar com desafios emocionais iniciais que uma pessoa poderia suportar com grande facilidade mais tarde”. Em outras palavras, um trauma não precisa parecer ruim para nós, adultos, para que tenha tido um impacto sério e duradouro em nosso desenvolvimento. A maturidade significa conhecer nossos traumas antes que consigam estragar uma boa parte de nossa vida adulta.
3. O Inconsciente
A ideia do inconsciente é central para a psicanálise. A mente é imaginada como dividida em duas zonas. Uma área minúscula e intermitente chamada de “consciente” e um terreno amplo, complicado, obscuro e atemporal chamado de “inconsciente”. Como a natureza da mente consciente é ser altamente melindrosa, esquecemos ou ignoramos constantemente incidentes cruciais que afetam nosso comportamento e humores aqui e agora. No entanto, eles vivem no presente escuro e contínuo do inconsciente. Um episódio traumático – uma rejeição ou humilhação – que aconteceu quando éramos pequenos ainda está fresca em nosso inconsciente como se tivesse acontecido ontem e seu efeito sobre nosso comportamento presente pode ser desproporcional ao que normalmente suporíamos.
4. Transferência
A transferência se refere à forma em que, depois de um tempo fazendo análise, começamos a reproduzir ou transferir para a relação terapêutica dinâmicas que vêm de nossa própria história psicológica. Por exemplo, podemos ficar convencidos de que o terapeuta é fraco ou um pouco fracassado, ou que é muito bem (ou muito mal) casado, esnobe, sistematicamente hostil ou nos admira distintamente – e tudo isso possivelmente tem pouca relação com a verdadeira vida e opiniões do terapeuta, sobre quem não devemos saber quase nada. Em vez de tentar suprimir essas fantasias, a terapia as usa.
5. Mecanismos de Defesa
A psicanálise entende que gostamos de manter distância porque muito do que podemos descobrir pode ser doloroso. É possível notarmos que, no fundo, estávamos profundamente furiosos com algumas pessoas que somente deveríamos amar, ou perceber que, embora quiséssemos ser pessoas decentes e cumpridoras da lei, tínhamos fantasias fortemente depravadas e aberrantes. Para esconder nossos pensamentos, usamos uma série do que a psicanálise chama de “mecanismos de defesa”.
Uma defesa é uma resposta a um medo, então uma parte importante do trabalho da análise é criar um ambiente em que tenhamos certeza de que não seremos atacados em nossos pontos frágeis, para finalmente nos arriscarmos a examinar nossas defesas – em vez de usá-las.
6. Divisão e Integração
Melanie Klein (1882 – 1960) foi uma psicanalista vienense que estudou a tendência humana profundamente enraizada à divisão. Durante a vida, mas particularmente na infância, enfrentamos frustrações e decepções, somos magoados e desapontamos por pessoas em quem queremos confiar. Essas frustrações podem parecer tão intoleráveis que nos defendemos ao dividir as pessoas em puramente boas e puramente más. Denegrimos algumas características de forma a preservar uma esperança pura com relação aos outros. Todos que nos irritam se tornam maus, todos que nos satisfazem são perfeitos. A resposta terapêutica à divisão é suavemente nos aproximar do que é conhecido como integração.
7. Colapso
Ter um colapso não é, aos olhos da psicanálise, o problema que frequentemente parece ser para o resto do mundo. Um colapso não é simplesmente um ataque aleatório de loucura ou desajuste, mas sim um pedido muito real – embora muito inarticulado – por saúde. É uma tentativa que parte de nossa mente faz em forçar a outra a passar por um processo de crescimento, autoentendimento e autodesenvolvimento que até agora ela se recusou a realizar. Falando paradoxalmente, é uma tentativa de dar uma partida forçada em um processo de enfrentarmos realmente bem uma fase em que estamos muito mal.
Durante um colapso, muitas vezes questionamos se estamos enlouquecendo. Não estamos. Estamos nos comportando de forma estranha, claro, mas por baixo da agitação superficial estamos em uma busca oculta, mas lógica, por saúde. Não ficamos doentes; já estávamos doentes. Nossa crise, se conseguirmos passar por ela, é uma tentativa de nos retirar de um status quo tóxico e um pedido insistente para reconstruirmos nossa vida de forma mais autêntica e sincera.
8. Apego: Evitativo e Ansioso
O psicoterapeuta inglês John Bowlby (1907-1990) foi a força motriz por trás do desenvolvimento da “teoria do apego”, o estudo sobre a forma em que crianças formam um elo emocional com seus cuidadores, que se torna a base sobre a qual elas lidam com relacionamentos com e como adultos. Como parte de seu trabalho, Bowlby identificou uma atitude “evitativa” em que normalmente afastamos ou somos frios com pessoas das quais gostaríamos, na verdade, de ser próximas. Fazemos isso, ele argumentou, porque nossa capacidade de confiar nos outros foi prejudicada na infância e aprendemos uma técnica de rejeitar o envolvimento como uma forma de preservar nossa integridade.
Ansioso
O apego ansioso se refere a um padrão de relacionamento com amantes em que, quando há dificuldade, ficamos intrometidos, rigorosos e controladores. Sentimos que nossos parceiros estão se afastando de nós emocionalmente, mas em vez de admitir nossa sensação de perda, reagimos tentando prendê-los. Ficamos exageradamente irritados se eles se atrasam oito minutos, repreendemos porque não realizaram algumas tarefas… Tudo isso em vez de admitir a verdade: “Não me sinto importante para você…”
John Bowlby não via esse padrão infeliz como algo fixo. Aprendemos uma lição que nossa infância pode ter nos negado: a de que alguém que não podemos controlar ainda pode ser leal a nossas necessidades.
9. O Superego
“Superego” é uma tradução esquisita, feita por James Strachey, primeiro tradutor de Freud para o inglês, para o termo alemão mais direto e elegante “Uber-ich”, que significa, literalmente, “Acima do Eu”. Com “Acima do Eu”, Freud se referia a um aspecto da mente que fica sobre nossa consciência rotineira comum, julga nosso comportamento e é o guardião de normas sociais e moralidade.
O Acima do Eu é uma internalização de pessoas que encontramos no começo da vida, tipicamente os genitores, especialmente os pais. Sem notar o processo, incorporamos as vozes que ouvimos ao nosso redor e acabamos falando com nós mesmos da mesma forma em que os outros falavam conosco. Às vezes, a voz do Acima do Eu pode ser incentivadora e paterna, mas, em outros momentos, nosso Acima do Eu pode ser impiedosa e punitiva.
Um dos grandes objetivos da psicanálise é reeducar o Acima do Eu.
10. Verdadeiro e Falso Self
Esta teoria psicológica do Verdadeiro e Falso Self é a obra do psicanalista inglês Donald Winnicott. Aos olhos dele, todos nascemos com um eu (ou self) verdadeiro. O self verdadeiro do bebê não está interessado nos sentimentos dos outros, não está socializado. Ele grita quando precisa – mesmo se for no meio da noite ou em um trem lotado. Pode ser agressivo, mordaz e – aos olhos de quem faz questão de bons modos ou ama a higiene – chocante e um pouco nojento. Winnicott acrescentou que, se uma pessoa quiser se sentir real como adulta, precisa ter aproveitado um período em que o Verdadeiro Self fez o que quis. Gradualmente, um Falso Self pode se desenvolver, tendo a capacidade de se submeter às demandas da realidade externa (escola, trabalho, etc.). Winnicott não era um inimigo ferrenho de um Falso Self; simplesmente insistia que ele só pertencia à saúde quando precedido por uma experiência detalhada anterior de um Verdadeiro Self desenfreado.
Infelizmente, muitos de nós não tivemos a chance de ser nossos Verdadeiros Eu. Talvez a mãe estivesse deprimida, ou o pai frequentemente se irritava, ou um irmão mais novo ou velho estava em crise e exigia toda a atenção. O resultado é que aprendemos a nos conformar cedo demais; ficamos obedientes à custa de nossa capacidade de nos sentirmos autenticamente nós mesmos.
Metas da Psicanálise
A terapia não pode nos deixar felizes todos os dias, mas seus benefícios são intangíveis. Depois de uma sessão de análise, nós nos sentimos consideravelmente mais livres. Percebemos que o que acreditávamos ser nossa personalidade inerente era apenas uma posição que assumimos para lidar com a atmosfera dominante. Depois de medir a real situação presente, podemos aceitar que poderia haver outras formas suficientemente seguras de sermos nós mesmos.
Ademais, tínhamos aprendido a ser envergonhados e quietos, mas a gentileza e a atenção do terapeuta nos incentivam a desgostar menos de nós mesmos e ser menos furtivos quanto a nossas necessidades. Depois de expressarmos nossos medos e desejos mais profundos, pode ficar um pouco mais fácil falarmos deles com outra pessoa. Pode haver uma alternativa ao silêncio.
Além disso, podemos ter mais compaixão: inevitavelmente, no decorrer da análise, percebemos o quanto fomos decepcionados por algumas pessoas no passado. Uma resposta natural seria a culpa, mas a reação eventual e madura (com base em um entendimento sobre como nossos defeitos surgiram) será interpretar seu comportamento nocivo como uma consequência da perturbação delas. As pessoas que nos causaram nossa ferida primordial quase invariavelmente não pretendiam fazer isso – foram machucadas e lutavam para aguentar. Podemos desenvolver uma imagem triste, mas com mais compaixão, de um mundo no qual tristezas e ansiedades são transmitidas entre gerações. A percepção não apenas comprova a experiência, mas também tê-la em mente significa que há menos a temer. Quem nos feriu não eram seres impressionantes e superiores que conheciam nossos pontos fracos especiais e focaram neles; eram também criaturas altamente agitadas e feridas que tentavam, do melhor jeito, lidar com a chuva de tristezas particulares a que a vida nos condena.
Acesse aqui nosso calendário para seu desenvolvimento emocional.