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Por que é bom se sentir “perdido” de vez em quando

É perfeitamente compreensível querer respostas para agora, de preferência neste exato momento – ou, pelo menos, nas próximas horas. As respostas sobre o que deveríamos estar fazendo da vida, com quem deveríamos estar nos relacionando, de que maneira resolver aquela discussão ou onde e como deveríamos estar vivendo. Já esperamos tempo demais e nossa paciência está quase no fim.

 

A mente humana é um órgão prestativo. Quando recebe uma tarefa (e sob a pressão de um imperativo), ela dará o seu melhor para cumpri-la. Ela ficará acordada a noite toda, se necessário, e se esforçará ao máximo: fará muitas anotações e entregará uma infinidade de documentos. Ela andará de um lado para o outro pela sala e se concentrará tanto que transformará nossa expressão num olhar sinistro. Ela se desligará de todos os outros deveres e responderá com rispidez a qualquer pedido para vir jantar ou tentar ver o lado bom das coisas.

 

É um esforço admirável, de fato, e às vezes bastante produtivo também. No entanto, por mais que respeitemos essa intensa busca por respostas, quase movida a torque, também precisamos dar espaço para o oposto. Precisamos nos permitir, apesar (ou por causa) do nosso imenso anseio por resultados e conquistas, períodos de liberdade para se perder completamente. Para não saber, por um longo tempo. Para bagunçar tudo e descobrir, com muito mais detalhes do que gostaríamos, que ainda não temos nenhuma pista. Se queremos alcançar resultados substanciais, talvez seja preciso antes se desapegar das expectativas de que eles aconteçam de fato.

 

Precisamos adequar nossas expectativas. Gostaríamos de ter o livro pronto até o Natal. Pode ser que isso só aconteça daqui a quatro anos. Queríamos saber no que deveríamos trabalhar até julho. Talvez ainda estejamos encalhados até março do ano seguinte. Isso é lamentável e, ao mesmo tempo, totalmente necessário.

Nossa mente precisa intercalar ciclos completos de sono e despertar, descanso e movimento. A mente humana aprende com os chamados períodos de distração, nos quais, por baixo da superfície, o trabalho analítico seguirá ocorrendo. Nossa mente precisa aprender a parar de tentar controlar o futuro e abrir espaço para os acasos felizes da rotina. Não sabemos o que esse novo álbum ou livro pode nos oferecer, mas decidimos dar uma chance mesmo assim. Não sabemos de antemão os ensinamentos que determinada jornada pode nos trazer, mas talvez valha a pena fazê-la apesar disso. Não podemos prever o que nossos amigos dirão durante o jantar, mas podemos aprender algo novo se aceitarmos o convite.

 

Em nome de novos horizontes, de novos aromas e de novas belezas, precisamos chacoalhar os padrões de pensamento arraigados. Nunca soubemos da existência deste quarto específico, com essa vista para os Andes ou para as colinas da Extremadura, e agora isso dará origem a outras descobertas mais íntimas.

 

Se impedirmos a chegada do novo, nunca poderemos produzir nada além daquilo que já sabemos. Precisamos ser um pouco mais otimistas com relação ao que chamamos de “tempo perdido”. Podemos passar a maior parte da vida tentando compreender o amor – ou para conseguir apreciar o que estamos tentando fazer com nosso trabalho. Esses são assuntos complexos, e a mente humana é um órgão errático e um tanto enrolado. Não se trata de tempo “desperdiçado”, mas do tempo que as coisas simplesmente levam. Estamos operando com uma ideia inútil de realização e, assim, nos esquecendo do papel primordial dos começos em falso e dos rascunhos na eventual conquista de algo bom ou verdadeiro.

 

É um pensamento doloroso, dado o quanto é desagradável estar perdido. Mas talvez tudo isso – o pânico, o atraso, a espera, as semanas sem saber –, tudo isso estranhamente pertença ao processo de encontrarmos o caminho. Tanto quanto a lógica e a razão, faz parte de chegar ao nosso destino.

 

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By The School of Life

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