Postado Ontem
Autoconhecimento
Como fazer um check-up emocional
Uma das grandes peculiaridades da psicologia humana é que não temos acesso direto e imediato a muitas de nossas emoções. Quando as pessoas nos perguntam “Como você está?” e respondemos de forma protocolar (e às vezes mentirosa) que está tudo bem, não é mera questão de educação: muitas vezes, nós de fato não sabemos o que estamos sentindo, por não estarmos em contato com nós mesmos.
É possível passar boa parte da vida com a atenção totalmente voltada para fora. Podemos liderar sucessivas reuniões, elaborar orçamentos complexos, viajar de um lugar para outro e, durante todo esse tempo, ter pouca ou nenhuma percepção ativa de que estamos – no fundo – nos sentindo exaustos, enfurecidos, com ciúmes, magoados ou mesmo melancólicos. As pessoas e as situações que nos deixaram assim podem já não estar mais presentes muito antes de nos darmos conta do gatilho que elas dispararam dentro de nós. Podemos ser o proprietário legítimo do nosso corpo, mas habitamos apenas uma parte muito pequena dele de forma consciente.
Nossa incapacidade de acessar e conhecer profundamente a própria mente vem da infância. A percepção que temos sobre nossos próprios sentimentos e emoções costuma ir até onde as pessoas à nossa volta se dispuseram em acolher o que estávamos de fato sentindo quando éramos pequenos, especialmente no caso das emoções que não costumam ser consideradas “normais” ou “boas”. Por exemplo, é provável que, quando éramos crianças, muitos de nós tenham expressado o súbito desejo de que a vovó morresse, ou de que a escola pegasse fogo, ou ainda de que nosso irmãozinho fosse enviado para um orfanato. Em casos assim, um excelente sinal de boa parentalidade é quando o pai ou a mãe é capaz de suportar ouvir essas complexidades sem censura, permitindo que a criança, aos poucos, tenha menos medo e esteja cada vez mais preparada para explorar os cantos sombrios de sua própria mente. O principal legado de ter sido ouvido por nossos cuidadores é uma maior capacidade de ouvir a si mesmo.
Contudo, se esta não foi a nossa sorte, podemos começar a recuperar o controle sobre nossos verdadeiros sentimentos por meio de um exercício de consciência, fazendo a nós mesmos uma série específica de perguntas. Em um momento de tempo livre, sem risco de interrupções, deite-se em algum lugar confortável e silencioso. Feche os olhos e entreviste sua mente como se ela pertencesse a outra pessoa.
Direcione as perguntas a seguir para você mesmo, sem pensar muito para responder, dizendo em voz alta a primeira coisa que vier à mente (tendemos a nos esconder ou mentir se tivermos muito tempo para pensar). Aqui vão as perguntas:
- Eu estou me sentindo…
A resposta pode acabar sendo mais triste, mais otimista ou mais sem graça do que você poderia ter imaginado.
- Neste momento, eu realmente precisava de…
Estamos sempre tão ocupados com as necessidades alheias que acabamos deixando de lado as nossas próprias. Isso muitas vezes acontece porque o que queremos ou precisamos não se encaixa na visão padrão daquilo que achamos que deveríamos ser ou desejar, tornando ainda mais importante essa checagem emocional. De fato, pode ser constrangedor admitir que gostaríamos de reatar com nosso ex, ou que não admiramos nossa própria mãe, ou que, no fundo, estamos precisando nos deitar em posição fetal e chorar por uma hora. Mas compreender nossas vontades é extremamente útil para evitar, por exemplo, uma gastrite, um torcicolo ou mesmo uma crise de depressão ou ansiedade.
- Estou com raiva porque…
Desde a mais tenra idade nos acostumamos a ter nossa raiva tolhida pelos adultos – mas isso não nos impede de senti-la. Na verdade, é justamente a própria sugestão subjacente de que a raiva é ruim que leva ao acúmulo de uma verdadeira fúria vulcânica.
- Uma coisa que me machucou recentemente foi que…
Somos mais sensíveis do que imaginamos (ou do que gostaríamos de imaginar). Aprendemos a ser duros, mas essa armadura só protege nossa superfície externa. Por dentro, choramos com a mesma frequência de uma criança de quatro anos.
- Meu corpo quer…
Pode ser estranho pensar que nosso corpo “queira” alguma coisa. Mas o fato é que o corpo físico tem tanto a nos dizer quanto a mente pensante. E se continuarmos a ignorar suas vontades e necessidades, obrigaremos nosso corpo a comunicar suas mensagens da única maneira que ele conhece: por meio de doenças.
Após alguns minutos nessa imersão, você talvez esteja se percebendo de uma forma um pouco diferente da que tinha antes. Talvez agora você se sinta uma pessoa um pouco mais estranha, mas também um tanto mais interessante e cheia de vida. A ideia aqui é justamente essa: conseguir trocar uma identidade plastificada e idealizada pela verdade. A sua verdade. Quanto mais próximos da nossa própria verdade pudermos estar, mais genuína será nossa existência, e mais leves e aliviados nos sentiremos.