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A Sabedoria do Anoitecer 

A Sabedoria do Anoitecer 

Nossos pensamentos são – teoricamente – livres para sair em qualquer direção a qualquer hora do dia ou da noite. Na prática, talvez muito mais do que ousemos admitir, continuam fortemente ligados ao local onde estamos na jornada axial de 24 horas da Terra em volta do Sol. Há ideias que fazem mais sentido para nós no começo do dia, enquanto outras precisam esperar até a tarde e algumas exigem que a noite nos convença.
Não pode haver momento mais ressonante nessa rotação do que aquele que conhecemos como o anoitecer, quando o sol vai se escondendo no horizonte e joga seus raios na atmosfera inferior, deixando o céu – por até 40 minutos nas latitudes ao norte e apenas 20 minutos nas equatoriais – não exatamente claro, mas nem tão escuro.
O anoitecer fascinava o artista norueguês Harald Sohlberg, que o pintou dezenas de vezes em diversos locais de sua Oslo natal – não apenas porque o achava “bonito”, mas também para focar nossa atenção nas transformações que essa hora do dia podem nos fazer psicologicamente. Pode haver muitos tipos de anoitecer em todo o mundo, mas o que eles nos sussurram tende a ser muito parecido.
Durante as horas do dia, somos convidados a ser intencionais. Nossos horizontes são limitados ao mundo humano. As sombras são curtas e nossas perspectivas também podem ficar assim. Levamos nossa parte minúscula da história adiante por alguns milímetros: enviamos e-mails, pedimos reuniões, participamos de uma conferência, escrevemos um artigo. Com o sol a pino, aumentamos nossas estimativas. Fazemos planos, acusamos alguém de nos desrespeitar, ficamos frustrados com nosso progresso.

No entanto, o anoitecer chega com sua lista de mensagens contrárias. Uma faixa de nuvem estreita a muitos quilômetros de distância fica em um tom carmim brilhante. Distâncias que tínhamos esquecido se fazem sentir. Não somos mais a mistura de todas as coisas. O que nos agitou diminui de importância. O momento nos pede para soltar o controle ardoroso que nossa mente tem da lembrança do documento que falta ou do andamento da reunião irritante; pela primeira vez em muitas horas, sabemos visceralmente que isso tudo vai passar.
O anoitecer convida todos nós – os desesperados, os ansiosos e os arrogantes – ao abrigo da noite, onde prioridades da vida adulta podem pesar menos. Não podemos fazer mais nada para alterar qualquer coisa; teremos de esperar e manter a fé. Devemos parar de ser arrogantes. Para aqueles de nós especialmente machucados, o anoitecer está ali para confirmar que tudo ficará bem, apesar do ódio, da vergonha e da ignomínia.
O que há de milagroso todo dia – e muitas vezes é perdido por pessoas extremamente ocupadas, conformadas ou convencidas – é que ele inevitavelmente termina. Não importa o quanto tenha sido ruim, e alguns dias são mesmo, chegará ao fim, e todas as coisas que extraem sua seriedade da luz do sol diminuirão com a proximidade da noite.

O anoitecer nos salva através da borracha que passamos no dia. Ele nos ajuda a recalibrar e deixa a nossa ansiedade ser absorvida. Devemos sempre lembrar que a sabedoria do anoitecer está sempre a poucas horas de distância.

 

Veja o nosso calendário completo aqui.

By The School of Life

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