
Postado Ontem
Autoconhecimento
Medos não são fatos
No mundo moderno, é comum estarmos sujeitos a picos extremos de ansiedade. E muitas vezes, quando estamos em um período particularmente tenso da vida, também é comum ouvirmos dos outros um velho clichê: um medo não é um fato.
Essa frase curta, na qual está comprimida tanta sabedoria, pode ajudar a tranquilizar nossa mente. Na ansiedade, é fundamental termos consciência da diferença entre o que é realmente real e o que parece real; entre o que realmente está acontecendo no mundo e o que está acontecendo em nossos pensamentos sobre o mundo. A catástrofe que imaginamos estar acontecendo ou que pode vir a acontecer muitas vezes não passa de um fantasma que criamos na própria cabeça.
No entanto, fica a pergunta: se um medo não é um fato, é o quê? Por que ele está tão poderosamente presente em nossa mente? E por que tem a capacidade de arruinar nossa vida?
Os medos que não tendem a desaparecer, os medos que são exagerados, exorbitantes, que consomem tudo e são tirânicos tendem a ser o que podemos chamar de medos sombrios. Porque são, de fato, sombras. Sombras de coisas assustadoras que aconteceram há muito tempo e que se lançam, injustamente, sobre áreas e momentos importantes da nossa vida presente. Esses medos contêm em seu núcleo um evento doloroso que aconteceu na infância ou juventude e que não foi devidamente explorado, entendido, sentido, processado, até ser finalmente colocado de lado.
Essa falta de investigação geralmente ocorre em parte porque nos faltou o apoio concreto (de um psicólogo, por exemplo), em parte porque sentimos que precisamos ser leais a quem nos feriu (nossos pais, professores, irmãos ou outros adultos que cuidavam de nós).
Como, então, podemos vir a conhecer nossos medos originais? Podemos deduzir muito do que precisamos saber sobre eles explorando o que nos assusta atualmente. As pistas sobre o que aconteceu há muito tempo estão na base de nossas apreensões atuais.
Imagine que estamos sempre com medo de ter feito algo “errado” no trabalho e de sermos excomungados e condenados. Ou que seremos expulsos de nosso grupo social. Ou que se tentarmos cortejar alguém, essa investida será recebida com fúria e horror.
A mente não se inclina naturalmente para suas próprias investigações terapêuticas; ela simplesmente pensa que um medo é um fato. Mas está em nosso direito decidir que já estamos fartos dessas conclusões rápidas e que agora queremos treiná-la para ser uma analista mais paciente de suas apreensões.
Podemos tentar associar os terrores que sentimos agora a algo mais antigo:
– Alguma vez tentamos fazer algo criativo e original na melhor das intenções, mas que acabou sendo recebido com fúria e repreensão?
– Alguma vez fomos expulsos de um grupo de amigos que se ofenderam conosco?
– Alguma vez demonstramos interesse amoroso em alguém e fomos cruelmente rejeitados?
Pistas podem vir à tona: pode sim ter havido alguma reação desastrosa de nossa mãe por conta de uma brincadeira boba; o nascimento de uma irmãzinha talvez tenha, de forma devastadora, tirado o holofote que nossos pais até então direcionavam a nós; talvez nosso pai tenha reagido de forma inadequada e repressora quando comentamos inocentemente estar apaixonado por tal coleguinha da escola.
É uma verdade básica da vida psicológica que nossas dores querem ser conhecidas. E quanto menos pudermos suportar ou conseguirmos conhecê-las, mais elas estarão presas aos problemas do presente que se assemelham a elas, até que não tenhamos outra opção a não ser dar-lhes atenção. Sofreremos por meio de sintomas e neuroses aquilo que não compreendemos e lamentaremos como eventos da realidade.