Voltar
Seu trabalho não deveria lhe angustiar

Seu trabalho não deveria lhe angustiar

Muitas vezes, a chegada de um feriado pode despertar em nós, junto com a empolgação de alguns dias descanso ou viagem, uma estranha mistura de sentimentos. Ela surge normalmente na véspera, quando ainda estamos terminando de arrumar a mala, empolgados com os dias prazeroso que estão por vir, mas ao mesmo tempo inquietos ou mesmo angustiados por conta de algo que não sabemos nomear.

 

Essa estranha mistura de sentimentos com relação a um feriado normalmente tem a ver com a ideia de ter que voltar para o escritório depois de um intervalo agradável, claro. Mas isso não contempla a complexidade do que está acontecendo: não é só que estamos em um tipo de trabalho que está piorando nosso humor; é que estamos passando nossos dias no tipo errado de trabalho – ainda que não saibamos qual pode ser, de fato, o tipo certo.

 

Todos temos dentro de nós o que podemos chamar de verdadeiro eu profissional, um conjunto de inclinações e capacidades que anseiam por se exercitar na materialidade crua da realidade. Nós queremos transformar as principais partes de quem somos em trabalhos e garantir que possamos nos ver refletidos nos serviços e produtos que estamos determinados a entregar. É isso que entendemos por “trabalho certo”, e a necessidade de ter um é tão fundamental e forte em nós quanto a nossa necessidade de amor. Podemos ficar tão tristes pelo fracasso em encontrar nosso destino profissional quanto pela falta de um companheiro. Sentir que estamos no trabalho errado e que nossa verdadeira vocação permanece não descoberta não é uma espécie menor de desconforto: isso pode ser uma crise existencial central nas nossas vidas.

 

Nós normalmente conseguimos manter os chamados insistentes do nosso verdadeiro eu profissional de lado durante uma semana comum. Mas ele certamente virá nos incomodar tão logo comece um feriado prolongado. Como um fantasma suspenso entre dois mundos, não lhe foi permitido viver ou morrer, e ele bate na porta da consciência, exigindo uma resolução. Ficamos tristes, ou mesmo em pânico, porque uma parte de nós reconhece que o tempo está passando e que não estamos, no momento, fazendo o que deveríamos fazer com o resto das nossas vidas. A angústia do feriado é a nossa consciência tentando inarticuladamente nos despertar para fazermos mais de nós mesmos.

 

Essa angústia, aliás, tem sua própria história. Até recentemente, cerca de um século atrás, não havia – para a maioria de nós – a questão dos nossos verdadeiros eus profissionais encontrando expressão em um trabalho. Trabalhávamos para sobreviver e ficávamos gratos com uma renda mínima. Mas essas expectativas não se mantêm mais. Hoje sabemos – porque há suficientes exemplos visíveis de pessoas que fizeram isso – que podemos aproveitar nossos talentos na máquina dos negócios. Hoje sabemos que não precisamos ser infelizes nessa área, o que adiciona um sentimento de vergonha se ainda o somos.

 

Não devemos ser tão duros com nós mesmos. Ainda não temos os mecanismos necessários para nos reunir com o nosso propósito. Está na natureza do nosso eu profissional ser bastante claro sobre as próprias insatisfações e, ao mesmo tempo, enlouquecedoramente obscuro sobre qual deveria ser a verdadeira direção. Nós podemos, portanto, ter certeza de que não estamos fazendo o que deveríamos e, ainda assim, desconhecer nosso verdadeiro propósito.

 

A resposta é paciência, estrutura e firmeza. Nós precisamos de um pouco da disciplina de um detetive – ou de um arqueólogo reunindo as peças de um pote quebrado. Nós não devemos despreocupadamente descartar nossa angústia como uma mera “melancolia de feriado”, a ser amenizada com as noites de diversão que virão ou uma série nova para maratonar. Nós devemos vê-la como pertencendo a uma busca confusa, mas ainda assim central, por um eu verdadeiro que foi enterrado sob a necessidade de agradar os outros e o desejo de status e dinheiro a curto prazo.

 

Em outras palavras, nós não devemos restringir essa angústia do feriado somente às noites do próprio feriado. Nós devemos colocar esses sentimentos contraditórios no centro de nossas vidas e deixá-los ser os catalisadores de uma exploração constante que se mantém ao longo das semanas comuns, dos meses e provavelmente dos anos, e que dá origem a conversas com nós mesmos e com amigos, mentores e profissionais. Afinal, algo muito sério está acontecendo quando tristeza e ansiedade emergem porque um feriado vai começar.

 

Não estamos incomodados por conta de uns dias à toa; nós estamos sendo lembrados de que precisamos tentar descobrir quem realmente somos – e de fazer justiça aos nossos verdadeiros talentos – antes que seja tarde demais.

 

Veja nosso calendário completo de aulas e eventos aqui.

By The School of Life

Compartilhe este conteúdo